Micro e pequenas empresas que possuem dívidas com o Instituto Nacional do Seguro Social ou com as Fazendas Públicas Federal, Estadual ou Municipal — sem que a exigibilidade esteja suspensa — não podem ser beneficiadas pelo Simples Nacional, que reduz e unifica a carga tributária. A decisão é do Supremo Tribunal Federal, que por dez votos a um, negou provimento ao Recurso Extraordinário 627.543, movido pela Lona Branca Coberturas e Materiais com repercussão geral conhecida.
A empresa questionava decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que a excluiu dos beneficiários do Simples sob a alegação de que isso está previsto no artigo 7, inciso V, da Lei Complementar 123/2006. Para o TRF-4, não é possível falar em ofensa ao princípio da isonomia ou do livre exercício da atividade econômica, pois o tratamento privilegiado em matéria tributária não exime as micro e pequenas companhias do cumprimento das obrigações.
Relator do caso, o ministro Dias Toffoli informou que a adoção do Simples é opcional para os contribuintes — por definição constitucional, e não por gosto do legislador. Ele disse que a manutenção das companhias no sistema sem o pagamento de tributos pode acarretar na falência do sistema que beneficia as micro e pequenas empresas. Isso afetaria grande parte do mercado, continua o ministro, pois 97,5% das empresas registradas no Brasil são micro ou de pequeno porte.
Dias Toffoli citou dados do Sebrae que apontam redução de 40% na carga tributária dos beneficiados pelo Simples, facilitando o cumprimento das regras para manutenção do benefício. Além disso, o ministro disse que não é possível imaginar que o STF dê provimento a uma demanda que beneficiará empresas em débito. Para ele, não é possível garantir que a inadimplência obrigatoriamente é consequência de menor capacidade econômica.
O relator afirmou que as empresas em débito possuem vantagem concorrencial em relação àquelas que arcam em dia com seus impostos, e disse que a a LC 123 resguarda os interesses das Fazendas Públicas. De acordo com ele, é um erro ver a lei como tábua de salvação para as micro e pequenas empresas que não pagam em dia seus impostos. Antes de votar contra o provimento do RE, Dias Toffoli indicou que não é possível colocar na mesma posição a empresa que arca em dia com seus débitos e o inadimplente que, apesar da possibilidade de parcelamento, não acerta suas dívidas.
O voto de Dias Toffoli foi seguido pelos ministros Roberto Barroso, Teori Zavascki, Rosa Weber, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Celso de Mello, Joaquim Barbosa e Gilmar Mendes, que citou a jurisprudência do STF sobre o assunto. Segundo ele, o tribunal rejeita sanções políticas em questão tributária, por entender que elas podem servir como forma de pressão para que o contribuinte quite as obrigações.
Gilmar Mendes citou as súmulas 70 — que veda a interdição do estabelecimento como meio coercitivo para o pagamento de impostos —, 323 — que afirma que não é válida a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para o pagamento de impostos — e 547 — que impede as autoridades de proibir a compra de estampilhas ou que mercadorias sejam despachadas.
Já Celso de Mello afirmou que é injusto permitir às empresas devedoras concorrer, com vantagens, com as empresas que estão em dia com suas obrigações. Para o decano do STF, isso representa ofensa à livre concorrência, classificada por ele como um dos princípios gerais que regulamentam a atividade econômica do país.
O voto dissonante foi do ministro Marco Aurélio, para quem “o Estado não pode dar com uma das mãos e tirar com a outra”. Segundo ele, impedir que empresas em débito com o INSS ou a Fazenda Pública se beneficiem do Simples é um fator de discriminação, algo socialmente inaceitável e contrário à Constituição ao criar o critério da regularidade fiscal. Declarando que “a isonomia foi ferida de morte”, Marco Aurélio afirmou que trata-se de uma forma coercitiva para forçar as micro e pequenas empresas a saldar seus débitos.
Durante a sustentação oral, a procuradora da Fazenda Nacional Sara Ribeiro Braga disse que a medida não representa qualquer restrição ao exercício da atividade econômica. Segundo ela, apenas foi retirado o benefício do tratamento diferenciado, por conta do descumprimento das exigências que cabiam à empresa. Ela disse que, caso a Lona Branca usufruísse dos benefícios do Simples, seria favorecida em detrimento de empresas com quem concorre diariamente e que estão em dia com suas obrigações.